Muitas autoridades permaneceram, desde sua criação, em uma situação que combina um ou mais dos problemas descritos no parágrafo anterior, sem terem conseguido dar um salto para uma política de concorrência consolidada. Há algumas exceções a isso, como Brasil, Chile e Colômbia.
Essa situação está relacionada a um problema estrutural de desenvolvimento na região, devido à economia política dos diferentes países. As economias da América Latina são extrativas de riqueza e não inovadoras. Isso se reflete em medidas de desempenho, como a baixa adoção de tecnologias recentes e o baixo investimento em pesquisa e desenvolvimento. As empresas dominantes na região têm interesse em manter uma política de concorrência fraca a fim de proteger suas rendas obtidas sob o sistema atual. Elas utilizam seu poder econômico e político para influenciar, entre outros: 1) o desenho das leis de concorrência; 2) sua aplicação; 3) regulamentos que afetam a intensidade da concorrência em seus mercados; e, 4) outras áreas de política pública destinadas a controlar o mercado e o poder político das empresas. O poder político pode ser usado não apenas para fechar mercados, mas também para impedir a adoção de regulamentos que forcem as empresas a internalizar os custos de spillover gerados por seus processos de produção, tais como a poluição ambiental.
Existe uma relação de influência mútua entre o poder de mercado e a influência das empresas nos processos políticos de formação de regras que afetam os mercados. Empresas de grande porte em termos de lucros agregados têm os recursos para incorrer em despesas de lobby e doações a partidos políticos, entre outros mecanismos, a fim de influenciar as decisões estatais. Isso é coloquialmente conhecido como "quack economics". Foi discutido se a lei de concorrência, como é entendida na sabedoria convencional, é uma ferramenta útil para abordar os problemas estruturais descritos.
Um ponto de discussão foi se é necessário adotar uma abordagem mais ampla do que o bem-estar do consumidor para abordar os problemas descritos através da lei de concorrência. Nesse ponto, enquanto o bem-estar do consumidor e seu foco nos preços não capta o dano total produzido pelo comportamento anticoncorrencial na economia, a incorporação de outras variáveis (por exemplo, políticas) na análise dos casos acarreta riscos relacionados aos custos da aplicação da lei de concorrência (por exemplo, incerteza firme e custos de litígio devido à complexidade adicional da análise).
À luz disso, uma primeira abordagem para maximizar os efeitos da política de concorrência no desenvolvimento sócio-econômico da região pode ser através da priorização das autoridades de concorrência. A aplicação pode ser focalizada nos mercados que são estratégicos para os objetivos de desenvolvimento, tais como acesso a tratamento médico, nutrição, insumos agrícolas, inclusão financeira, educação etc. Ainda, também nos quais pode haver uma questão de poder político - que pode ser medida por indicadores tais como gastos com lobby e doações a partidos políticos. Dessa forma, a análise de fatores políticos e outras variáveis, tais como externalidades ambientais e saúde, estaria confinada à escolha de mercados prioritários. A análise do caso específico (investigação para práticas anticompetitivas ou controle de fusões) seria feita com fundamento na atual estrutura analítica baseada em um correto entendimento da eficiência econômica e do bem-estar do consumidor.
Um problema subseqüente é a eficácia da aplicação da lei de concorrência nesses mercados. O problema foi discutido e observou-se que muitas empresas tratam as multas e danos (quando as leis os prevêem) como um custo de produção e que isso não altera seu comportamento. A viabilidade de preferir remédios estruturais - como desinvestimento e danos punitivos - em vez de remédios comportamentais, quando confrontados com as seguintes condições: 1) reincidência; e, 2) mercados sensíveis para o desenvolvimento econômico. Foi então discutida como uma possível questão de pesquisa. O uso de remédios estruturais é uma questão de grande relevância prática e acadêmica. Não há muitos dados para tirar conclusões gerais sobre seus efeitos, apenas estudos de alguns casos específicos, como a quebra da AT&T nos EUA e da IG Farben na Alemanha.
Finalmente, vale a pena perguntar como a lei de concorrência interage com as outras ferramentas de política pública que o Estado tem para controlar o poder econômico e político. Isso pode servir para delimitar o escopo das intervenções das autoridades de concorrência.
Em resumo, as possíveis questões de pesquisa que emergiram do workshop são as seguintes: como as autoridades de concorrência na América Latina priorizam os mercados nos quais intervêm ex officio? Essa priorização se reflete na prática? Quais são os critérios que as autoridades de concorrência podem usar para identificar mercados estratégicos para o desenvolvimento socioeconômico e que, ao mesmo tempo, uma intervenção da autoridade pode ajudar a atingir esse objetivo? Qual tem sido a utilização de remédios estruturais pelas autoridades de concorrência na região? Quais são os critérios que podem ser levados em conta para preferir tais remédios em vez de remédios comportamentais? Que tipo de dados podem ser usados para medir o desempenho desses remédios ou da política de concorrência em geral - efeitos sobre os preços ou efeitos sobre outros indicadores de inovação e produtividade? Qual é o papel das autoridades de concorrência na solução de problemas estruturais de desenvolvimento, dadas as outras ferramentas disponíveis ao Estado para controlar o poder econômico e político das empresas - tais como obrigações de transparência e limites de gastos com lobby e doações a partidos políticos?
Participantes:
México: Enrique García
Costa Rica: Pamela Sittenfeld
Colômbia: Juan David Gutiérrez
Perú: Tania Zuñiga
Chile: Felipe Irarrázabal
Brasil: Calixto Salomao
Argentina: Maria Fernanda Viecens and Esteban Greco
Uruguay: Luciana Macedo
Moderador: Francisco Beneke